Acabou por se revelar uma experiência única. Quando lá chegamos, só conseguia pensar que iria ser mais uma actividade turística tão banal como tantas outras. Uma aldeia no meio do nada com umas cabanas feitas com tudo o que os locais tem à mão e alguns quilómetros de uma única linha ferroviária que transporta maioritariamente…turistas. Ali apenas havia alguns tuk tuks que tinham transportado algum pessoal desde Battambang e não parecia que a linha do comboio fosse usada para mais alguma coisa. A rede ferroviária no Camboja está em condições deploráveis e as tentativas de reconstruir uma das secções entre Battambang e Phnom Penh rapidamente caíram por água abaixo.
Não tinha a certeza se queria fazer isto pois não sabia se isto era ou não positivo para os locais. Olhando em redor vi um pequeno grupo a trabalhar junto à linha. Mas tudo o que faziam era desmontar e mudar as “carruagens”. Estas “carruagens” não eram mais que uma plataforma de bambu de 3mX2m com dois eixos e um motor. Estas plataformas movem-se nos dois sentidos de uma única linha pelo que se houver outra a vir no sentido contrário, a que tiver menos gente tem que ser desmontada e extraída dos carris. Se o numero de passageiros for o mesmo em ambas as plataformas, os condutores fazem um jogo de papel, pedra e tesoura para ver qual tem que sair e qual segue em frente.
À chegada na “estação” fomos recebidos por um polícia muito simpático que nos explicou as “regras” do comboio e prometeu tomar conta da nossa mota e dos capacetes. Disse que a viagem demoraria cerca de 20 minutos para cada lado com uma paragem na outra vila de outros vinte minutos. Pensei que se ninguém na verdade sai magoado de tudo isto e que se o trabalho não é árduo , talvez os 5 dólares por pessoa que pagamos para fazer isto vão de facto ajudar a comunidade local. Esperemos que sim.
Entramos no comboio, o nosso condutor ligou o motor e partimos. Tendo em conta a sua simples construção, a carruagem movia-se bastante rápido e tremia e abanava para os lados e só nos podíamos agarrar ao chão em bambu. Passados uns minutos reparamos noutra composição a vir na nossa direcção. Perdemos. Eles eram 4 e nós 3. Levantamo-nos e afastamo-nos e 5 minutos mais tarde estávamos de novo em andamento por entre campos verdes e vazios. Assim que chegámos à paragem final fomos invadidos por por um grupo de miúdos a vender pulseiras. Miúdos simpáticos e muito queridos que queriam que prometêssemos que compraríamos as pulseiras a eles a mais ninguém. A promessa era selada com um cruzar de dedos especial entre ambas as partes. Houve um pequenos de 5 anos que me abordou. Caí no seu feitiço e lá me comprometi.
Eu sei que as crianças não devem trabalhar e que isso rouba um pouco da sua infância. Todos os avisos e slogans conhecidos sobre o assunto me passaram pela cabeça mas por um lado estes miúdos estavam felizes da vida e isto era só uma maneira de passarem o tempo livre. Uma senhora sorridente com um bebé ao colo convidou-nos para uma bebida fresca que prontamente aceitamos. Era meio dia e estava a ficar muito calor. O mesmo miúdo, o Tee, com quem me tinha comprometido veio ter comigo e perguntou se queria jogar papel, pedra e tesoura. Quem perdesse tinha que abanar um leque feito de papel para o outro 10 vezes. Jogamos por 10 minutos e rimos a cada resultado do jogo quando outra rapariga se juntou a nós e continuamos os 4 em jogo. Fiquei um pouco surpreendida que, apesar de as pulseiras estarem pousadas em cima da mesa ninguém mais nos pediu para comprarmos nada. Só no final, quando chamei o Tee para lhe comprar uma pulseira, havia mais duas raparigas a tentarem vender. Eventualmente comprei duas, uma ao Tee e outra à rapariga que jogou connosco. Pobre Renato. Não comprou nada e durante uns minutos teve uma rapariga a insistir que lhe compra-se alguma coisa.
O pequeno Tee fala inglês muito bem o que me surpreendeu bastante. Tive algumas situações com outras pessoas onde me respondiam apenas em Khmer. Na escola não aprende ainda Inglês pois só começam com línguas estrangeiras a partir do secundário mas tem aulas particulares por 10 dólares por mês e aprende com os turistas.
Quando pagamos as nossas bebidas a mulher disse-nos para não nos esquecermos de dar uma gorjeta ao nosso motorista. Um dólar não vai fazer diferença e receberemos em troca um sorriso especial.
Nunca pensei que uma coisa tão turística me pudesse trazer tanto gozo. Parte deste gozo foi conseguir encontrar a primeira aldeia, vendo o modo de vida local e os imensos animais pelo caminho. O comboio de bambu não está sinalizado em lado nenhum.
Video aqui.
Magda